Picante – um sabor do Mundo

Outubro 18, 2022 sem comentários daniela Categories Blog, Publicações, Receitas

Quando se fala de comida picante somos quase sempre transportados para paragens longínquas. No meu caso, por fazer tantas viagens pelo mundo com a Zen Family, vou directamente para oriente.  A minha mente viaja de imediato para o Nepal, Butão e Índia, embora a comida picante seja apanágio de outros destinos como México, Tailândia e vários países africanos.

Nós por cá temos muitas vezes a idéia que o picante aquece, o que não é de todo mentira, uma vez que a sensação de ardor nos faz sentir muitas vezes como um dragão a cuspir fogo e a transpirar. A verdade é que se observarmos com um pouco mais de atenção, percebemos que o picante é usado na maioria das vezes em países nos quais o calor se faz sentir de uma forma bem mais intensa do que aqui em Portugal.

Uma das coisas que percebi em viagem é que o picante ajuda a resistir ao calor e ajuda o corpo a resistir a muitas doenças. No Nepal corre a história que o povo Tharu (um grupo étnico indígena que vivia nas bases montanhosas do sul dos Himalaias) é conhecido por ser naturalmente imune à malária que afectou esta área de rios, lagos e selva luxuriante, que é Chitwan. A população circundante ainda hoje atribui essa façanha à alimentação do povo Tharu, que sempre foi dominada por um sabor intenso a picante, acompanhado por aguardente de arroz. Mais tarde verificou-se que esta resistência pode ser causada por uma alteração genética deste grupo étnico, mas a verdade é que este tipo de alimentação também ajudou.

Os alimentos picantes têm imensas propriedades. Por causarem dor, isto é uma dor ligeira associada à ardência provocada, a sua ingestão faz com que o nosso cérebro produza endorfinas que combatem a dor (pela acção analgésica) e nos proporcionam prazer. Nuno Crato, no seu livro “Passeio Aleatória pela Ciência do dia a dia”, refere até que o tempero picante é quase um sedativo, mas um sedativo benigno.

Em doses normais, a pimenta, ou o picante além da libertação de endorfinas e da acção analgésica, têm efeitos tónicos e antissépticos, estimula os sistemas circulatório e digestivo e aumenta a transpiração. Da minha observação, esta propriedade antisséptica pode ser uma explicação para que em tantas zonas cujas condições de vida não são as desejáveis, não existam assim tantas doenças.

Está comprovado que a alimentação picante pode ajudar a prolongar a esperança média de vida, ajudando a reduzir a probabilidade de contrair algumas doenças e a tratar de outras. Os principais benefícios derivam da capsaicina, componente presente principalmente na malagueta e pimenta caiena.

Além de aumentar a temperatura do corpo e nos fazer transpirar, o picante também traz outros benefícios para a saúde, como:

  • Ajuda a perder peso devido ao seu efeito termogénico e consequente aceleramento do metabolismo.
  • Previne e ajuda a tratar doenças cardiovasculares, uma vez que que os componentes picantes ajudam a aumentar o fluxo sanguineo.
  • A capsaicina tem efeito anti-oxidante, antimicrobiano, anti-inflamatório e previne o cancro.
  • Melhora a aparência da pele, pois a transpiração abre e limpa os poros.
  • Ajuda a tratar a artrite e fibromialgia através da ação anti-inflamatória e analgésica.
  • Previne gripes e constipações devido às propriedades antimicrobianas e antivirais.

O picante é usado em todo o mundo, e em Portugal, África e Brasil desde que o Vasco da Gama descobriu o caminho marítimo para a Índia e trouxe esta especiaria que começou a ser cultivada por todo o mundo, deixando de estar apenas na mesa dos mais abastados.

Um outro país que usa e abusa do picante é o Butão. De todas as viagens que já fiz pelo mundo, talvez este seja o local onde o seu consumo é mais intenso. Até mais do que na Tailândia, onde tive a minha primeira experiência de “dragão” e do que a Índia!

Tudo no Butão leva picante. Malagueta em doses avultadas e todos adoram este tempero, que começam a ingerir desde muito pequenos. É muito engraçado ver que muitos de nós ficamos com o ardor característicos desta substância, vermelhos e transpirar e que os butaneses passam imunes a este efeito, que causa muitos momentos de diversão tanto para nós como para eles.

Ficam aqui duas receitas, uma do Butão e outra da Tailândia, que podem encontrar nos meus livros “Sabores do Viajante” (já vencedor em Portugal com o primeiro prémio do Gourmand Award na Categoria Heath & Food) e “Viagens da comida Saudável”, respectivamente, para assinalar este dia internacional da comida picante.

Espero que gostem. Bom proveito e boas viagens!

Daniela Ricardo